sábado, 31 de outubro de 2009

JOSUÉ GUIMARÃES: MESTRE DA LITERATURA FANTÁSTICA

O esforço de Jorge Luis Borges, Adolfo Bioy Casares e Silvina Ocampo de selecionar contos para compor a “Antologia de la Literatura fantástica”, em meados de 1960, foi bem recebido, porém se perdeu no tempo e no espaço.

Da eclética antologia constam nomes consagrados como Casares, Borges, Ocampo, Lewis Carroll, Julio Cortázar, James Joyce, Franz Kafka, Maupassant, Poe, Rabelais, Sinclair, H. G. Wells, entre outros grandes escritores. Parece-me que os organizadores limitaram-se a escolher predominantemente obras da Literatura de língua espanhola, inglesa e francesa, esquecendo-se das de língua portuguesa.

Republicada regularmente, essa antologia (cujo exemplar que detenho atinge a vigésima primeira edição, 2008) insistiu em se manter alheia ao desenvolvimento da Literatura fantástica brasileira. Por essa razão, a obra continuou incompleta por excluir o maior nome do gênero entre nós e, indubitavelmente, um dos mais importantes no mundo: Josué Guimarães.

Com carreira tardia, assim como Saramago iniciada após os quarenta anos, Josué Guimarães consagrou-se escritor quando publicara “Enquanto a noite não chega” em 1978. Alguns poetas se eternizam apenas por parte de sua obra ou por um poema. Josué Guimarães já percorreu considerável trajetória literária, porém, se pudéssemos apontar uma obra fundamental, a novela que narra o cotidiano de Dom Eleutério e dona Conceição numa cidade decadente da qual, com exceção do coveiro, são seus únicos moradores seria escolhida com destaques e louvores.

Discute-se o caminho da morte desde o princípio pelo deserto urbano e pelas ruínas arquitetônicas, pelo desgaste de utensílios (como a falta de barbeador de Dom Eleutério) ou pelo fim da comida (economizada ao extremo por Dona Conceição que sabe que os alimentos não serão repostos), pela fantasia da rememoração mesclada aos acontecimentos contemporâneos, numa evidente ausência de discernimento entre devaneio salutar e delírio nostálgico e patológico.

A mistura entre tempos, lugares, pessoas e episódios permeia todo o enredo que discute secundariamente posicionamentos sobre guerras, escolhas e família, pondo em relevo a condição humana senil na perspectiva do abandono e da efemeridade, dos costumes e das recordações, ressaltando a importância da solidariedade e da compaixão como moedas de sobrevivência.

Um espaço como esse seria curto para tratar das questões intrínsecas e explícitas de um grande livro – embora considerado uma novela que dificilmente ultrapassa as noventa páginas – e de mostrar a genialidade brasileira no Rio Grande do Sul, contudo é mais do que suficiente para mandar um recado a Borges: se as causas perdidas só podem interessar a um cavalheiro, podemos escolher as armas do duelo?


*Publicado originalmente na Série Especial Dez Escritores Contemporâneos do Oeste Notícias (Presidente Prudente – SP) de 30 de outubro de 2009.

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá. Meu nome é Priscila e sou professora. Quero te congratular pelos artigos que vão sair sempre às sextas-feiras. Muito bom. Priscila de Presidente Prudente, São Paulo.