Quando concluiu o ensino médio, pediu ao pai um quadro-negro e, quatro meses alfabetizando crianças pela manhã e adultos à noite, percebeu que realmente tinha vocação para a docência de modo que se encerrava no quarto durante as tardes, os fins de semana e os feriados para memorizar as fórmulas de química, de física e de matemática, os conceitos de história, de geografia e de Literatura, as complexidades de filosofia e de sociologia, a inutilidade da biologia e dos movimentos políticos contemporâneos.
Embora o primeiro lugar na classificação geral tenha ficado distante de seus objetivos e de suas possibilidades cognitivas, concluiu o curso de pedagogia e o mestrado em educação com êxito sendo contratada por uma escola de classe média.
Ao fim da primeira semana de trabalho (sorrisos, cumprimentos, anedotas, café com bolachinhas salgadas, mães se apresentando e exaltando as qualidades dos filhos), o diretor chamou-a à sala onde já estavam uma coordenadora, um consultor de negócios e o proprietário da escola. Fechou a porta à chave.
O diretor pensou em abrir a janela. Porém, o dono da escola o desautorizou. Um assunto importante não poderia correr o risco de sair pelos ares, atravessar os muros e pousar nos ouvidos da concorrência.
- Quando a procuramos, os decanos da faculdade de educação nos garantiram que a senhora possuía requisitos e qualificações mais do que necessárias.
O dono ajeitou-se na cadeira, afrouxou a gravata, desabotoou o colarinho e manteve a posição das pernas. O diretor continuou:
- Sem rodeios: trabalhamos no vermelho há três anos e meio. Ou mudamos nosso método, ou fechamos as portas. Já enviamos professores para cursos de pós-graduação, ampliamos o estacionamento e a piscina, reformamos a quadra de esportes, colocamos condicionadores de ar em todas as salas e também nos banheiros, distribuímos bolsas de estudos anuais para os melhores alunos... Enfim, fizemos o possível. Não tem mais jeito. A senhora é nossa única chance.
O diretor detalhou os problemas financeiros graves.
- Se resolver um problema, um único problema, estará de bom tamanho, assegurou o diretor. Os demais aquiesceram.
Apontou com o polegar para a direita:
- Aquele problema.
A escola ao lado levara quase sessenta por cento dos discentes. Passou meses revirando livros, visitando teorias, lendo relatos de casos. Conversou com professores da faculdade que, sem saber o que fazer, encorajavam-na a continuar estudando para encontrar uma solução.
Vislumbrava a carta de demissão do primeiro emprego que mal durara um ano. Quando se preparava para anunciar o fracasso ao diretor, o silêncio incômodo da escola vizinha despertou-lhe atenção. A qualquer hora do dia jamais ouvia ninguém pulando, gritando ou berrando. Como aconteciam as aulas de educação física?
Pulou o muro dos fundos da escola adversária e na primeira sala descobriu o segredo da eficiência.
Semana seguinte, o diretor a convidou para uma reunião na sala em que já a esperavam a coordenadora, o consultor financeiro e o dono da escola.
- Então, professora? Conseguiu resolver nosso problema? Perguntou apreensivo o diretor.
- Certamente. Descobri que os pais não querem apenas uma escola tradicional com práticas educativas modernas. Querem educação eficaz, imediata e satisfatória. Para alcançarmos essa educação, seguiremos as sugestões desse pequeno prospecto que escrevi.
- E de que trata esse prospecto? Curioso, o consultor.
- De um método infalível: Pedagogia do Espancamento.
*Publicado originalmente no Jornal de Assis (Assis – SP) de 5 de novembro de 2009.
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