terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

APRENDENDO INGLÊS


As oportunidades da rede mundial de computadores: sexo, exercício físico, comida, livros, viagens, móveis, remédios, hotéis, sapatos e, até mesmo, curso de idiomas. Provavelmente a hipótese da dificuldade paterna passou despercebida pelo filho quando pagou curso de inglês que prometia, em 12 parcelas de 500 reais e 48 semanas de atividade pedagógica, tornar qualquer um fluente na língua de Dickens.
O filho mexeu no mouse, ajeitou a tela do computador, ajustou o som, apontou as setas de “volta” e de “adiantamento” das lições on line, anotou, em um caderno, o telefone para conversar com especialistas sobre problemas técnicos, despediu-se do velho exigindo, nos próximos três meses, o domínio básico do idioma que o tornaria independente para visitá-lo na Irlanda.
- Calma, papai. Tenha muita calma.
Os comandos – didaticamente dispostos em fichas coloridas – pareciam simples: solucionou o primeiro, o segundo e o terceiro exercícios numa quinta-feira, retornando às lições na manhã seguinte. Ultrapassou sem dificuldades o quarto, o quinto e o sexto. Em seguida, o sétimo, o oitavo e o nono. Porém, concentrava todas as suas forças contra a imensa barreira da décima lição. Assimilara bem os indicadores do passado e do presente, mas que raio significava aquele verbo que, no presente, indicava algo realizado no passado presente que, por sua vez, diferenciava-se completamente do passado remoto, absolutamente distinto do passado cujo conteúdo manifestava incertezas?
Passou a mão no telefone. Milagrosamente a telefonista o atendeu em menos de três minutos. Depois de explicar suas dúvidas na composição sintática e semântica, ouviu a justificativa de que a função daquele número limitava-se a esclarecer problemas técnicos – páginas que não abriam, senhas bloqueadas, supressão de som, imagens incompletas...
- Como vou resolver meu problema com o idioma?
- Isso eu não sei, senhor, respondeu a atendente. Aqui, resolvo apenas problemas técnicos. Tenha um excelente dia. Fique na linha para avaliar meu atendimento.
À noite, quando o filho indagou se o inglês abria horizontes, o pai, olhando o computador partido ao meio por uma cadeirada, asseverou:
- Está abrindo muitas coisas!

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