Na quinta, sexta e sábado da semana passada ocorreu, na Universidade Estadual Paulista (UNESP) em Assis (SP), o Festival da Palavra, organizado pela direção do campus e pelo conselho administrativo do Poiesis, tendo Antônio Lázaro de Almeida Prado como um dos homenageados.
Professores, estudantes, admiradores literários, ensaístas, críticos literários e escritores participaram do evento. Por motivos de agenda, presenciei apenas o desenrolar dos atos na sexta-feira de manhã quando o poeta Almeida Prado e dois especialistas em Literatura, Márcio e Suzana, compuseram uma mesa-redonda para discorrer sobre tensão e distensão na poesia.
Márcio abriu o encontro, seguido da voz fabulosa de Suzana e, por fim, da intervenção de Almeida Prado, poeta e professor emérito da universidade. Na fecunda explicação sobre poesia, Almeida Prado me surpreendeu em dois momentos. Primeiro, ao convocar os jovens para escrever poesia. De acordo com ele, temos essa capacidade de transmutá-la ao papel. Um alfaiate que faz uma roupa ou um arquiteto que concretiza um prédio são poetas na medida em que conseguem transpor elementos do mundo natural, psicológico ou espiritual para o mundo concreto.
Embora não tenhamos conversado sobre o tema, observo que, em um segundo momento, Almeida Prado e eu comungamos de uma teoria lingüística elementar e de uma ferramenta pedagógica sutil: a liberdade. Quando discorria sobre o processo de criação literária, enfatizava que os emissores são os únicos responsáveis pela mensagem eficiente que deve chegar aos receptores. Em outras palavras, o professor é o responsável pelo insucesso dos alunos se estes não entendem a matéria. O professor (emissor) deve se preocupar com uma explicação que facilite a vida dos alunos (receptores) no estudo de uma disciplina. Se atinge esse objetivo, sua explicação (mensagem eficiente) alcançou o que podemos chamar de finalidade didática.
Neste próximo mês de outubro, se as contas não me falham, Almeida Prado completa oitenta e cinco anos. Décadas voltadas à Literatura e à cultura de maneira geral: dádivas, persistências e teimosias, principalmente para quem pretende socializar a cultura, a Literatura e a vida no velho Oeste paulista. O avanço da idade do poeta é como o vinho: permite melhor degustação com o tempo.
Uma de minhas primeiras atividades numa sala de aula: transmitir aos alunos, em eufemismos compreensíveis, que as aulas de filosofia ou de sociologia são aulas de liberdade. De modo que, sem entrar nos méritos da obra de Bobbio, permanecer ou fugir é o primeiro passo. Primeiro passo do aluno que pode procurar atividades mais interessantes. Primeiro passo do professor que tem um esboço de resultado da ação pedagógica aplicada. Pelo menos sessenta por cento dos alunos comparecem às aulas, mesmo que eu esclareça que todos têm presença garantida. O fato de participarem de aproximadamente três horas de filosofia e de sociologia traduz que, se tudo correr bem, teremos profissionais adequados para lidar com os processos de aproximação ou de separação de grupos sociais e sensíveis ao questionamento temático universal.
Alguns professores acreditam que a caderneta de presença constitui a única arma para manter o aluno em sala. Prender o corpo e não controlar o espírito desemboca naquela história infantil de Rubem Alves. Não me lembro o título do livro, mas o cronista conta que um passarinho e uma menina se dão muito bem. De tempos em tempos o passarinho levanta vôo, fica uns dias fora e depois volta alimentando, como sugere o narrador, a saudade que torna a vida mais doce. Um dia a menina resolve engaiolar o passarinho que perde sua alegria de viver, sua vontade de sonhar e sua coragem de romper espaços.
Certamente não sou o mais preparado para tratar de métodos pedagógicos, mas Educação e Poesia estão visceralmente entrelaçadas e, aliando as observações de Almeida Prado à história infantil de Rubem Alves, concluímos que os alunos e os leitores são como pássaros: devemos deixar a gaiola aberta para que passeiem onde, como e onde queiram. Se voltarem à sala de aula ou à poesia, constataremos que a saudade, ingrediente dos grandes amores fraternos, denuncia nossa união de afinidades, de simpatias e de paixões.
*Publicado originalmente na coluna Ficções, no Caderno Tem!, do Oeste Notícias (Presidente Prudente – SP) de 24 de setembro de 2010.