Álcool e calor são
duas variantes longe de combinarem. Resolvemos passar alguns dias na praia de
maneira que, carros, malas e euforias a mil, saímos de madrugada e ao fim do
dia estacionávamos na casa de veraneio de amigo de trabalho, alugada a preço
acessível. As mulheres entraram rapidamente, limparam sala, quartos, cozinha e
banheiros, determinando que os homens usariam o de fora enquanto às mulheres
destinava-se o de dentro. Saímos (nós, os homens) rumo à praia e ficamos nas
areias o resto da noite, retornando para a residência de verão por volta das
duas da manhã. Acomodamo-nos como e onde conseguimos e, manhã seguinte, filhos
e esposa já gritavam palavras de ordem: praia, praia, praia!
Tomamos banho para
tirar o resto de cheiro das bebidas da madrugada e meia hora depois parávamos
num boteco a cem metros do mar de onde, sem grande esforço e com muita atenção,
observávamos as esposas e os filhos jogando-se nas ondas que os levavam e os
traziam de volta à areia. Combinamos de diariamente repetir o trajeto das
manhãs e de fins de tarde: crianças e mulheres na praia; homens, no bar.
A rotina de bar e
praia se mostrou satisfatória até o terceiro dia quando, alguns dos amigos,
empolgados com as cervejas e a vista de lindas mulheres de biquínis quiseram
estender o expediente tarde adentro retornando para casa quase alta noite.
O grande problema
disso tudo é que, quanto mais ficávamos no bar, mais as bebidas – já não se
engolia apenas cerveja – pulavam goela abaixo, animando os camaradas a contarem
piadas, provocarem rivais de times de futebol, abordarem temas políticos sem
importância, atacarem as denominações religiosas, discordarem dos acordos
trabalhistas de grandes empresas, paquerarem descaradamente as meninas de
dezoito ou vinte anos cujos cabelos pareciam a continuação do mar. Entre uma e
outra paquera, o namorado de uma das meninas avançou sobre a mesa. Escapamos da
pancadaria. O garçom – acostumado a esse tipo de situação e prevendo aquele
resultado a qualquer momento – conversou com o surfista sugerindo-lhe esquecer
o incidente e voltar à noite para uma bebida por conta da casa. Por conta da
casa? Que nada! Quando saímos – ou melhor, quando fomos convidados a nos
retirar – notei acréscimos em nossa conta.
Quase sete horas
quando entramos em casa. Os meninos brincavam de bola na frente, outros jogavam
cartas aos fundos. As meninas liam revista de fofoca, informando-se sobre o
desaparecimento do sapato de apresentadora de televisão avaliado em dez mil
reais e pago em dezenas de parcelas no cartão de crédito. Duas esposas descansavam
nas redes: uma, folheando a revista nos últimos raios de sol; a outra,
ressonando profundamente.
Jogamos alguns
colchões no único espaço livre: o corredor entre a cozinha e a sala. Um dos
amigos de copo trouxe três ventiladores. Espalhou-os de tal maneira que o vento
atravessasse de um lado a outro sem interrupções. Apertou o botão do primeiro:
nada. O do segundo: nada. O do terceiro: nada. Levantamos todos na intenção de
ajudá-lo e cada um, conforme seu extraordinário e nulo conhecimento de
eletrônica e de aparelhos domésticos, opinava, forçava a hélice, verificava se
a tomada estava bem encaixada...
Depois de conferir
todos os itens básicos e de o suor escorrer intransigentemente pela temperatura
elevada do janeiro torrencial, a paciência se esgotou e um dos amigos
arremessou o ventilador – adquirido dias antes de nossa viagem – contra a porta
do banheiro. O segundo ventilador – pertencia a outro amigo que tomara quase
meia garrafa de aguardente, dois copos de conhaque e cervejas – socou seu
aparelho, convencendo-se de que se tratava de mau olhado da sogra, deixada com
o cunhado. Solidário aos amigos, já me preparava para acabar com o meu quando a
esposa do dono do primeiro ventilador, que ressonava tranqüilamente na rede,
entrou esbaforida:
- Como vocês querem –
perguntou, entre quase dormindo e irritada – que os ventiladores liguem se
estamos sem energia elétrica desde o início da tarde?
*Publicado
originalmente na coluna Ficções,
Caderno Tem!, do Oeste Notícias (Presidente Prudente – SP) de 11 de janeiro de 2013.
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