sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

MULHERES DE LONDRINA


Deveria adquirir o direito de viajar a Londrina (PR) nos meses de extremo calor quem atingiu o discernimento das pequenas observações. As londrinenses detêm charme inigualável durante o frio trajando roupas iguais, semelhantes cortes de cabelo, maquiagens idênticas e movimentos corporais sem surpresa, mas apenas o calor – inspirando-se na fábula de Esopo – as obriga aos mínimos panos: camisetas, shorts, saias, vestidos, chinelos ou sandálias.


Se Olinda (PE) ou Ouro Preto (MG) podem integrar a lista de Patrimônios Culturais da Humanidade, às Mulheres de Londrina o título de Patrimônio Natural das Gostosuras.


Quem – sentado ao Calçadão, visitando lojas, caminhando ao redor do Lago Igapó, bebendo suco na Universidade de Londrina ou a ela se deslocando nos ônibus sufocantes e lotados, tomando sorvete no shopping ou procurando lugar no cinema, atrasando-se ao teatro ou adiantando-se ao barzinho, esquecendo-se do horário de chegada à rodoviária ou trocando o dia do vôo – não presenciou uma Mulher de Londrina sorrindo, ajustando o cabelo, conferindo as unhas, os dentes ou as sobrancelhas? Mexendo na bolsa, verificando informações ao celular, aumentando o alcance de notícias corriqueiras? Procurando a página certa do livro equivocado?


A Mulher de Londrina jamais perde tempo caminhando na rua. Simplesmente se devota à tarefa de desfilar sua beleza e ampliar os minutos de nossa contemplação. Nunca almoça, janta ou lancha, entretanto degusta com seus lábios sedutores. Em nenhuma hipótese sorri: explode as barreiras de nossa cegueira para o belo, o significativo, o inexorável.


Contemporaneidade, pluralidade, democracia, conhecimento, elegância, pontualidade, percepção, sensibilidade, delicadeza, força e perseverança são características da Mulher de Londrina que, pelo cosmopolitismo, abre as portas para o universo. Mulher de Londrina não é quem nasceu em Londrina, mas quem adotou estilo de vida moderno, perdeu-se da mesquinhez, da estupidez e da falta de amor para se dedicar à vida e, sem vergonha de alcunhas de brega, fixar uma placa à porta: “Aqui mora uma mulher bem-amada”. Portanto, quem ainda não encontrou o amor, o prazer, o sorriso, o carinho, a felicidade, a sutileza e a vontade de ultrapassar os limites do transcendental, basta se transformar, o mais rapidamente possível, numa Mulher de Londrina. Uma mulher resumida em duas palavras: completa, perfeita. Uma mulher que não se define pelas formas ou pelas curvas, contudo pelo singular estado de espírito.


Obviamente algumas exceções desmontarão meu discurso: num ambiente fechado ou nas pressas de fim de ano, de carnaval ou de promoção de lojas de departamentos, algum homem sombrio ou mulher invejosa identificarão uma ou outra serpente mal educada esgueirando-se entre o jardim de rosas da espécie mais perfumada – que é a Mulher de Londrina. Aos invejosos um banho de silêncio, de compreensão e de piedade. Não se discute quem opta por estilos diversos do bem-viver, do bem amar, do bem sonhar, do tirar o sono dos amantes e de atiçar os desejos de quem se considerava para lá do terceiro tempo do jogo.


Quem percebe uma Mulher de Londrina perdida no Jardim Botânico de João Pessoa (PB), na Biblioteca Nacional (RJ), no Teatro Amazonas (AM), na Casa de Cultura Josué Montello (MA) ou na Casa de Cultura Mario Quintana (RS), esperando foto com Dalton Trevisan (PR) ou água de coco com Autran Dourado, Affonso Romano de Sant’Anna, Deonísio da Silva, João Ubaldo Ribeiro ou Rubem Fonseca na orla do Rio de Janeiro precisa de discernimento, agilidade mental e ação eficaz para conquistá-la e aprisionar-lhe o coração. A oportunidade de trabalhar uma pedra preciosa não nos bate à porta todos os dias. A loteria dificilmente premia os que desesperadamente recorrem a ela. Sutileza, sensibilidade e percepção são fundamentais.


Um fragmento bíblico nos alerta: muitos os chamados, poucos os escolhidos. São divinamente contemplados os que se envolvem com mulheres perfeitas e completas. Muitos são os que desejam mulheres perfeitas e completas; poucos os que detêm o privilégio de desfrutar, conviver e amar uma Mulher de Londrina.


*Publicado originalmente na coluna Ficções, caderno Tem!, do Oeste Notícias (Presidente Prudente – SP) de 10 de fevereiro de 2012.

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